A Incrível Odisséia de Maneco, o Gato


Era uma noite de dezembro de 2022. Eu estava aqui no computador quando o interfone tocou. Era o porteiro dizendo que uma mulher estava me chamando. Eu desci e era uma conhecida dos passeios com meus pets. Ela estava meio nervosa e me arrastou até à praça onde se reuniam mais conhecidas minha em volta de uma caixa trasnportadora de animais de estimação. Dentro da caixa extremamente suja, um gato estava deitado, acordado, mas sem forças nem para levantar a cabeça. Era o início de uma jornada. 

O gato estava muito mal. A caixa estava terrivelmente suja, com ração jogada na própria caixa, uma bagunça. Disseram que ele foi abandonado na praça, mas a história era confusa, outras diziam que ele estava com sem-tetos e por aí vai. Mas, nada disso importava, eu sabia o que elas queriam: que eu assuminsse a responsabilidade e cuidasse dele. 

Olhando o estado do gato, eu sentia como se minha alma abandonasse meu corpo, e eu me senti gelar por inteiro. Eu estava com medo, pois sabia que, no estado em que ele estava, a coisa seria muito complicada e bem cara para se lidar. Mas, eu não conseguia simplesmente dizer não. Eu sabia que se  me negasse ele poderia morrer. Essa era a terceira vez que faziam isso comigo, porém,  agora o animal estava em um estado muito mais grave que os outros. 

A que me chamou pelo interfone se ofereceu para ir à clínica veterinária e fomos. Quando ele foi atendido, é que vimos a extensão do problema. Ele tinha um curativo que cobria sua parte traseira e uma de suas pernas. Estava sujo. Quando o veterinário tirou, vimos que a perna é que estava brutalmente ferida. Na foto acima podemos ver como estava, mas, ao vivo era pior ainda. Ela estava quebrada e ferida. Na verdade, como viríamos a saber depois dos raios-x, ela estava esmigalhada. 

Como haviam feridas menores na coxa, o que se pôde deduzir é que ele foi atacado por algum cachorro grande que triturou sua perna traseira. Deve tê-lo sacudido violentamente. Não havia como salvá-la. Talvez por saberem disso, e das despesas, seus donos o colocaram em uma caixa transportadora e o abandoram à própria sorte. 


A perna teria que ser amputada, totalmente e assim foi feito. Mas, mesmo sendo uma clínica "popular", o custo da internação seria alto, pois ia a recuperação ia demorar. Fomos embora, deeixamos ele lá, e a moça que estava comigo se comprometeu a conseguir doações. Eu ainda estava meio anestesiado e concordei. Achava que ele não ia aguentar a cirurgia e que não sobreviveria. Mas, aceitei a proposta. As outras conhecidas também fizeram doações pelo Whatsapp. 

A perna foi amputada com sucesso e ele sobreviveu. Quando fui visitá-lo vi que estava comendo ração e até se levantava. O cone na cabeça era o que menos o incomodava. Quando estava indo embora, uma epifania me atingiu e o nome dele me veio à mente. Disse à atendente, "o nome dele é Maneco". Parecia o melhor nome para ele. 

Os dias começaram a passar e a internação estava engolindo qualquer doação que as amigas faziam. Era uma turma pequena, mas generosa. Porém, os dias começavam a virar semanas. Eu não queria pedir doações ao amigos do Canal de Quadrinhos do Telegram, pois estes já ajudavam a comprar HQs  para fazer serem compartilhadas. Então, aconteceu o pior, um dos meus outros gatos adoeceu gravemente. Agora eram duas despesas, 

Sem outra saída, eu resolvi pedir ajuda aos amigos do Telegram e aí aconteceu algo incrível, eles ajudaram e muito. Mas, o custo de vida da Zona Sul do Rio de Janeiro parecia querer derrotar eu e Maneco, pois já faziam duas semanas e não havia previsão de saída.

A perna amputada levou pontos. Porém, por ter sido uma amputação muito rente ao corpo, os pontos arrebentaram, pois a pele não era suficiente para segurar a linha. Ao ver aquela vala aberta no corpo do gato eu pensei, já era. Mas era só falta de conhecimento meu. Os veterinários disseram que ele ia ter uma cicatrização por "segunda intenção", algo que eu não fazia ideia do que era. Mas, basicamente, ia cicatrizar sem pontos. Olhando a ferida aberta parecia algo impossível e, claro, seria mais demorado. Eu precisava de mais dinheiro. 

Eu já havia recebido doações de várias pessoas, e agora não dava pra pedir mais. Eu precisava encontrar outra maneira. Então só havia um jeito: vender uma boa parte de minha coleção de gibis e livros. Enquanto Maneco se curava, eu passei dias escolhendo e encaixotando livros e gibis. Por fim, somaram 20 CAIXAS! Eu calculava por baixo que havia umas mil edições ali. E agora o problema era outro, transportar. 

Sem carro, eu sabia que não dava para contar com taxistas. Seriam umas três viagens pelo menos. Então lembrei de uma rapaz que trabalhava com aquela espécie de carroça que eles mesmos puxam, e que transportava entulho e tudo mais. Contatei ele e fomos pegar as caixas. Como o lugar era perto, dava pra levar tudo de uma vez. Foi a primeira vez que me desfiz de uma quantidade tão grande de material. 


Quando fui pagar e visitar Maneco, ele já estava internado a duas semans e meia. E quando vi a ferida cicatrizando eu levei um susto. Estava mesmo fechando sem os pontos. Parecia mágica. Mas ainda faltava fechar totalmente. Então, quando completou três semanas inteiras, eu tive que dizer que ia levá-lo, pois não havia mais recursos. A cicatrização teria que terminar em casa, comigo fazendo os curativos. E foi assim que fiz, e Maneco se despediu de todos.

Em casa ainda levou uma duas semanas para cicatrizar totalmente. Eu aplicava Rifocina e uma pomada ao redor para não pousar moscas. Ele detestava estas sessões, mas era estava tudo indo muito bem. Por fim, só havia um ponto que não cicatrizava de vez e eu perguntei à veterinária se podia passar uma pomada para ferimentos que eu costumo usar neles, e ela deixou.E assim fechou tudo, completamente. ]

Tudo isso com ele ficando dentro de uma gaiola que compramos, para que ninguém mais o perturbasse. Eu colocava  lá dentro, com uma caixa, sem areia mesmo, porque ele ficava assim na clínica e dava certo. Água e ração. Era sua suíte. 

Após a cicatrização a recuperação foi bem rápida. Apesar de reservado Maneco se mostrava carinhoso, mesmo que arredio com outros gatos. O mais interessante é que dos cachorros ele não tinha medo, mesmo eu achando que ele sofreu ataque de um. 

O pelo recobriu a cicatriz e parecia que ela nem existia. Eu parei de fechar a gaiola por cima, coloquei uma banqueta para ajudar ele a entrar e sair e pronto. Ele podia ficar lá na gaiola só quando quisesse. Mas, as surpresas com sua recuperação não paravam. 


Certo dia entro no quarto e Maneco havia sumido. Procurei embaixo da cama e em todo canto e nada. Foi quando olhei pra cima do guarda-roupa e não acreditei. Aquele gato de três pernas estava lá em cima. E só havia um caminho para lá, que os outros usavam, e não era um caminho fácil. Ele havia subido na cômoda, pulou para a porta, ficou pendurado nela, se puxou pra cima, se equilbrou e pulou para o guarda-roupa. Era sobrenatural. Eu ainda o veria fazendo isso ao vivo. 

Eu tentava evitar que ele subisse, mas a porta batia num armário e não ia para trás toda. Ele chegou a cair uma vez, pois escutei o barulho, mesmo assim continuava. Atualmente ele parou, pois pois ficou gordinho e sabe que não dá mais. 

Mostrei fotos dele desde que ficou na clínica até as peripécias no guarda-roupa a todos que ajudaram, inclusive no Telegram. Todo mundo ficou feliz que ele não apenas sobreviveu, mas virou um gato saudável e bonito. Maneco parece saber que o salvamos e, mesmo sendo um gato "sério", ele sempre aceita e dá carinho. 

Todo medo de não conseguir lidar com a situação se dissipou logo nos primeiros dias e o resultado final beirou o milagre, pois não consigo imaginar quanto tempo ele ficou de mão em mão, até chegar a mim. No fim das contas tudo valeu a pena. Maneco está feliz e nós também. 

P. S.; Apesar de toda a alegria com Maneco, o gato que adoeceu nesse meio tempo, nosso Pitchu, faleceu, pois ele era FELV positivo (uma doença que só aparece nos gatos), e esteve saudável por muito tempo, e justo naquele período a doença resolveu se ativar e ele morreu em poucos dias. Foi triste, acho que Maneco veio pra que suportássemos isso. 

Maneco já dando ordens à irmã Ursa e a seu irmão pestinha Limirrú

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